O impacto do dólar na inflação do Brasil
Será que a gente come dólar? Da polêmica ao esclarecimento, esse artigo analisa a importância da cotação do dólar no dia-a-dia do brasileiro.
A influência da taxa de câmbio na economia brasileira é um tema de grande relevância, especialmente em um país onde uma parcela significativa da cesta de consumo tem relação direta ou indireta com o dólar.
Muitos questionamentos chegam até mim sobre esse tema, em especial de dois dos meus leitores mais assíduos, que frequentemente perguntam por que o dólar é um assunto tão falado e por que ele impacta tanto a economia brasileira.
Missão dada, missão cumprida. Lá vou eu aqui dar os meus 2 centavos sobre o assunto.
Antes de tudo, coloco aqui que esse é um tema que é tratado com uma polêmica que não deveria, afinal a cotação do dólar é definida por múltiplos fatores e um dólar mais alto ou mais baixo sempre trará benefícios e malefícios.
Curiosamente, essa semana li dois relatórios interessantes sobre o tema feito pela equipe de análise macro da XP Investimentos.
Os relatórios "Qual o impacto do dólar no bolso do brasileiro?" e "Real continua mais fraco do que sugerem os fundamentos".
Aqui, exploraremos de forma clara e didática como a desvalorização cambial afeta os preços internos, a inflação e o poder de compra dos brasileiros, além de discutir as condições necessárias para uma moeda mais estável.
Além de trazer a minha opinião sobre o assunto, vou colocar aqui alguns insights interessantes retirados desses artigos.
Afinal, a cesta de consumo brasileira é dolarizada?
Embora muitos brasileiros acreditem que o impacto do dólar se restringe a produtos importados, como eletrônicos e veículos, a realidade é que grande parte do que consumimos sofre influência direta da taxa de câmbio.
Segundo os estudos da XP, aproximadamente 44,7% da cesta de consumo possui alguma exposição ao dólar, seja porque o produto é importado, porque seus insumos são precificados em moeda estrangeira ou porque o preço é atrelado às commodities internacionais.
O exemplo clássico é o pão.
O Brasil precisa importar trigo.
O preço do trigo é cotado em dólar.
Quando o dólar sobe, é mais custoso para o brasileiro importar trigo.
Como consequência, o preço do pão para o consumidor aumentará.
O mesmo ocorre com os combustíveis, cujo preço é definido de acordo com o valor do barril de petróleo no mercado internacional.
Dólar sobe, gasolina sobe.
Além disso, bens duráveis como celulares, eletrodomésticos, automóveis e roupas importadas sentem de forma expressiva a desvalorização do real.
Mas será que o dólar impacta tudo o que consumimos?
Sim, a alta do dólar impacta diretamente a inflação, mas de maneira diferenciada entre os produtos.
Os eletrônicos, por exemplo, costumam apresentar uma relação quase imediata: um aumento de 10% na taxa de câmbio tende a elevar os preços desses itens em até 8%.
No caso do vestuário, essa influência é menor, variando entre 2% e 5% para cada 10% de depreciação do real.
Mas o que passa muitas vezes despercebido é o efeito indireto que o dólar mais alto causa.
Com a alta do dólar, muitos insumos utilizados na indústria nacional se tornam mais caros, encarecendo a produção e levando a aumentos de preço mesmo em produtos fabricados no Brasil.
Isso significa que até mesmo itens que não são importados podem sofrer reajustes devido às pressões cambiais.
Curiosamente, alguns políticos costumam afirmar que "ninguém come dólar", tentando minimizar o impacto da taxa de câmbio no dia a dia da população.
Mas isso é verdade?
Na prática, essa afirmação desconsidera que insumos básicos da alimentação, como trigo e milho, são cotados internacionalmente, e sua alta impacta diretamente os preços internos.
Portanto, mesmo que ninguém "coma dólar", ele está embutido no custo da comida que chega à mesa do brasileiro.
O que faz o dólar subir ou cair? Há especulação contra o real?
A taxa de câmbio é influenciada por uma série de fatores, tanto internos quanto externos.
No cenário global, os juros dos Estados Unidos desempenham um papel central.
Quando o Banco Central americano, o Federal Reserve (Fed), eleva as taxas de juros, investidores retiram dinheiro de países emergentes, como o Brasil, e aplicam em ativos mais seguros nos EUA, fortalecendo o dólar.
Além disso, eventos globais como tensões comerciais, crises financeiras e variações nos preços das commodities também impactam diretamente o real.
Muitas vezes, políticos alegam que há uma "especulação" contra o real, mas isso é apenas uma simplificação de um fenômeno mais complexo.
O que realmente afeta a moeda são os fundamentos econômicos do país.
Risco fiscal, credibilidade do governo, estabilidade política e diferencial de juros do Brasil e outras economias são fatores que determinam a confiança dos investidores na moeda nacional.
Se o Brasil apresenta sinais de descontrole fiscal, aumento da dívida pública ou instabilidade política, os investidores se desfazem do real, causando sua desvalorização.
Ou seja, não há uma "mão invisível" conspirando contra o real, mas sim a percepção do mercado em relação à solidez econômica do país.
Como tornar a moeda mais estável?
Antes de tudo, devemos deixar bem claro: não existe uma taxa de câmbio ideal.
Um dólar alto demais pressionaria demais a inflação, assim como um dólar muito baixo estimularia um consumo desenfreado de produtos importados que poderia gerar um déficit comercial significativo no país, já que os produtos importados ficariam mais baratos que os domésticos e, aos olhos de um gringo, tudo no Brasil ficaria caríssimo.
Se há consenso entre os economistas de que não há uma taxa que é “adequada”, há um consenso de que ter um dólar mais estável traria mais previsibilidade para as tomadas de decisões de consumo e investimento das pessoas.
Para garantir um real mais estável e reduzir a volatilidade cambial, algumas medidas são essenciais.
O primeiro passo é manter uma disciplina fiscal, assegurando que as contas públicas estejam sob controle.
Isso reduz a percepção de risco dos investidores e torna o real mais atrativo no longo prazo.
Além disso, uma política monetária previsível e independente contribui para um ambiente mais estável, transmitindo confiança ao mercado.
O fortalecimento da produtividade da economia também é fundamental: países mais produtivos tendem a ter moedas mais valorizadas, pois atraem investimentos e aumentam sua competitividade internacional.
E por fim…
Esse artigo serve muito mais para elucidar a importância da taxa de câmbio no dia-a-dia do que abordar o quão oportuno é investir ou não em dólar.
Ok, mas meus dois leitores são curiosos e eu presto contas a eles aqui…
A minha resposta é chata, mas acredito ser a adequada: é importante ter uma parte do patrimônio investido em dólar, mesmo que seja uma parcela pequena.
Esqueça a cotação do dólar na hora de pensar nisso.
O mercado financeiro brasileiro representa apenas 2% de toda indústria, o que limita muito as opções disponíveis.
E quando falamos em investir em dólar, falamos de mandar o dinheiro lá para fora literalmente, não investir em ativos atrelados ao dólar.
Hoje em dia, está muito fácil fazer isso sem barreira de idioma.
Procurem saber mais sobre. Ou me perguntem aqui o que vocês precisarem.
Um beijo no coração de cada um de vocês.