Uma ponte para 2026: gambiarras, impostos e o Brasil que insiste em tropeçar nos próprios cadarços
Para onde esse bonde vai nos levar? Chegamos no topo das taxas de juros e da inflação? Um bull-market nos espera logo mais?
Começou o mês de junho e já mostramos a que viemos: improvisar mais um ajuste fiscal, agora em versão "alternativa ao IOF", como quem troca a porta de lugar e dá a casa como reformada.
A tônica do governo desde o segundo trimestre de 2024 tem sido a mesma: avisa-se do problema, promete-se enfrentá-lo, mas só se mexe em arrecadação. A despesa? Fica ali, intocada, como um elefante atravessando a sala enquanto todos elogiam a tapeçaria.
A novela do IOF foi só mais um episódio do mesmo enredo.
O governo se viu diante da necessidade de cumprir a meta de resultado primário e, ao perceber que aumentar o IOF seria politicamente impopular (e tecnicamente frágil), voltou-se para o que considera seu plano B.
Foi aí que entrou em cena a proposta de taxar os até então isentos da renda fixa: LCIs, LCAs, CRIs, CRAs, debêntures incentivadas e outros bichos exóticos que só existem no zoológico fiscal brasileiro.
A alíquota sugerida? 5%. Pensando isoladamente, faz sentido tributar esses veículos, afinal, eles, SIM, causam distorções alocativas no mercado de capitais.
Mesmo com um certo consenso em relação à medida, a notícia não veio bem digerida.
Não se trata de demonizar a medida em si, pelo contrário.
Em muitos países, não há isenção nenhuma, e a lógica de simplificar e unificar a tributação da renda fixa tem seus méritos.
O problema aqui é sempre o mesmo: a decisão vem de forma abrupta, sem costura técnica, sem diálogo com a sociedade e com um jeitão de quem quer tapar buraco, não pavimentar estrada.
Como de hábito, algum corte de gastos mais robustos segue no escaninho dos sonhos de verão.
Nada de reforma da previdência militar. Nem toque na bomba dos supersalários.
Vai ficar para 2027, afinal 2026 já bate na porta e desde que o mundo é mundo não há governo que faça cortes em ano de eleição.
Com a perspectiva de que a nova tributação só valerá a partir de 2026 — em respeito ao princípio da anualidade do Imposto de Renda — as instituições financeiras já se movimentam para aproveitar a janela.
Esperem um boom de emissões de LCI e LCA nos próximos meses.
Os especialistas, claro, já começaram a fazer as contas.
Para uma LCI render o mesmo que um CDB de 100% do CDI, ela terá de pagar algo como 89% do CDI líquido.
Antes, bastavam 85%.
Parece pouco do ponto de vista arrecadatório, mas multiplique isso por dois anos, por centenas de milhares de investidores, por um trilhão de reais em estoque.
O impacto é real.
Ainda assim, para ser justo, eu não diria que essa mudança tira a atratividade da renda fixa no Brasil, afinal os nossos juros estão altos e por algum tempo assim devem ficar.
Do ponto de vista institucional, na minha modesta opinião, mais do que as medidas em si, é uma certa quebra de previsibilidade.
A insegurança jurídica que ronda essa mudança — feita via Medida Provisória, sem consulta ampla, e com comunicação truncada — contamina a percepção de risco.
Como observou Érico Pilatti, segurança jurídica é sinônimo de atração de capital.
E, convenhamos, o investidor estrangeiro que olha para esse nosso carnaval tributário deve se sentir num daqueles parques temáticos onde a única certeza é que vai sair tonto.
Lá fora, o ambiente tampouco colabora.
A guerra comercial sino-americana ganhou novo capítulo, com Trump dobrando tarifas sobre aço e alumínio e transformando Xi Jinping num personagem recorrente do noticiário financeiro.
A China, por sua vez, vive um processo deflacionário persistente: queda nos preços ao consumidor, tombo nos preços ao produtor e um ambiente interno fragilizado por excesso de estoques e guerra de preços entre empresas locais.
Nem mesmo os feriados nacionais conseguiram dar tração ao consumo interno. A locomotiva asiática, pelo menos por ora, parece patinar.
Nos Estados Unidos, o mercado de trabalho ainda resiste, embora com sinais crescentes de desaceleração.
O payroll (dados de criação de emprego) de maio veio abaixo do esperado, mas não o suficiente para alarmar o Fed.
O recado permanece: cortes de juros virão, mas só mais adiante e em doses homeopáticas.
Isso tem implicações diretas para o Brasil: num mundo em que os juros das economias centrais permanecem altos por mais tempo, o espaço para afrouxamento nos emergentes fica limitado.
A exceção à regra veio do IPCA de maio: alta de 0,26%, abaixo da mediana das projeções de mercado. Menor pressão em alimentos, leve alívio nos transportes, e mesmo o vilão da energia elétrica não foi suficiente para estragar a festa.
A inflação acumulada em 12 meses ficou em 5,32%, também abaixo do esperado.
Dá para dizer que foi uma boa notícia? Dá. Mas boa o suficiente para mudar o curso do Copom? Ainda não sabemos. Teremos resposta na semana que vem, quando o colegiado de reúne para decidir os rumos das taxas de juros novamente.
O Focus desta segunda trouxe algum alívio também, com recuo nas expectativas de IPCA para 2025.
O mercado começou a flertar com a ideia de que talvez o Banco Central tenha feito o bastante por ora, afinal, manter a Selic em 14,75% já é, por si só, um freio de mão puxado.
Convenhamos: se um juro real ex-ante de quase 9% não for suficiente para trazer as expectativas para a meta, talvez seja hora de repensar se o problema é de meta ou de método.
O Brasil de junho de 2025 vive, portanto, num limbo curioso.
Há uma sensação clara de exaustão fiscal, um mal-estar institucional crescente e uma política monetária que parece já ter entregado boa parte do que podia.
Ao mesmo tempo, o cenário externo não colabora, e o governo, em vez de liderar com estratégia, ensaia reações fragmentadas a crises que ele mesmo fabrica.
Mas o mercado tem memória curta e olhar longo.
Se os sinais de moderação fiscal, mesmo que tímidos, se confirmarem; se o Copom sinalizar que o juro atingiu seu teto; se as reformas deixarem de ser apenas notas de rodapé e voltarem à pauta com algum protagonismo... então poderemos estar diante de um cenário mais interessante do que muitos imaginam.
Não seria a primeira vez que o Brasil surpreende positivamente depois de flertar com a desesperança.
Um grande bull market, aliás, costuma começar quando ninguém mais acredita.
E talvez, apenas talvez, estejamos nos aproximando desse ponto.
Pode não ser agora, mas se o ciclo de cortes na Selic começar entre o fim de 2025 e o início de 2026, como cada vez mais parece provável, o investidor que estiver posicionado desde já poderá olhar para trás com orgulho das decisões que tomou em junho de 2025.
Fiquem atentos. Mantenham o radar ligado.
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Um beijo no coração de cada um de vocês.
Cadarços? ...nas próprias orelhas, isso sim!